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Entrevista exclusiva com o autor do livro Gastronomia Brasileira – Na Linha do Tempo

jornalista Roberto Pinto

O jornalistas Roberto Pinto, que já trabalhou em grandes veículos de comunicação, tanto no Brasil como internacionalmente acaba de lançar o livro Gastronomia Brasileira – Na Linha do Tempo (Edições Tapioca, 344 páginas) traz um panorama dos últimos 40 anos da cozinha brasileira profissional, a partir do movimento inaugurado pelos chefs franceses Laurent Suadeau, Claude Troisgros e, depois, Emmanoel Bassoleil, nos anos 80 e 90 (“Cozinha Bossa Nova”).

Roberto tem se empenhado na questão dos ingredientes nacionais, locais, raros e preciosos que a legislação brasileira tem dificultado que alcancem as melhores mesas e brilhem mundialmente, a exemplo de outras regiões do Mundo.

O Olhar Turístico realizou uma entrevista exclusiva com o autor:

OT – O que é a cozinha bossa nova e quais os principais pilares foram implantados pelos chefs estrangeiros?

Roberto – Os pilares dos franceses (Claude Troisgros, Laurent Suadeau e Emmanuel Bassoleil), e mais o italiano Luciano Boseggia eram simples: qualidade, técnica, criatividade e ingredientes locais. Os chefs brasileiros que seguiram esse mesmo rumo, nos anos 90, acrescentaram dois outros ingredientes à receita: tradição e pesquisa. Esse movimento foi chamado assim porque, como a nossa música, que misturou jazz e samba-canção, ele combinou o apuro da alta gastronomia, sobretudo francesa, espanhola e italiana, com a nossa cozinha ancestral.

OT – O que fazia o laboratório de Gastronomia Brasileira e quais ingredientes foram trabalhados na época?

Roberto – Esse laboratório pede aspas. Foi uma iniciativa de alguns dias, em junho de 2006, promovida pelo Caderno Paladar, do Estadão, reunindo três expressões da culinária brasileira da época – o Edinho Engel, o Alex Atala e a Mara Salles. Eles listaram os ingredientes que quiseram e trabalharam com eles na cozinha da também recém-criada Faculdade de Gastronomia Anhembi-Morumbi, durante alguns dias. A ideia foi um embrião da gastronomia brasileira que se conhece hoje. Impossível lembrar de tudo o que eles usaram nesse laboratório. Talvez o Luiz Américo Camargo se lembre de alguns.

OT – O que são ingredientes naturais, raros ou especiais?

Roberto – O mandiopã, o fubá da dona Virgínia e a araruta – vendidos pela Mercearia Paraopeba, em Itabirito-Minas Gerais; o peixe que o chef Cauê Tessuto traz das praias do litoral sul de São Paulo e do Paraná para serem consumidos no mesmo dia, nos restaurantes de São Paulo; capital; o cabrito do Frigorífico Baby Bode, de Feira de Santana, na Bahia – produzido por criadores do agreste nordestino – o mel de abelhas nativas do Jerônimo Villas-Bôas e o queijo com sotaque da Elizabeth Schober, de Santa Catarina – são alguns exemplos – mas a lista é vasta.

OT – Onde os ingredientes nacionais estão sendo mais resgatados / usados / valorizados?

Roberto – Nos dois extremos, infelizmente: nos rincões, onde isso é natural, mas a formulação é menos elaborada, e nas grandes cidades, nos melhores restaurantes. A valorização só não é maior por causa dessa regulação esquizofrênica que nós temos. Muitos produtores e até alguns chefs sofrem pilhagens, achaques, confiscos: como esse recentes, de algumas semanas atrás, que privou o pessoal do Rock in Rio dos sanduíches da chef Roberta Sudbrack, uma das mais talentosas do país. O queijo era de Pernambuco e só poderia ser consumido naquele estado. A linguiça, de São Paulo e não tinha o selo exigido para a venda no Rio de Janeiro. O livro propõe uma articulação entre os chefs e entidades dos produtores para encaminhar uma regulação apropriada dessas normas, junto ao Congresso Nacional.

OT – Quais os ingredientes raros mais cobiçados pelos chefs da nova geração?

Roberto – Todos os que foram aqui citados, penso eu, e mais alguns, que eles procuram e descobrem todos os dias. Feijão guandu, baunilha do cerrado, maçã de coco, cogumelo brasileiro, formiga limonera, alfavaca da Amazônia, maçunim e bivales (moluscos amazônicos), folha de vinagreira, mel de Mandaçaia, carne de fumeiro. Restaurantes como o D.O.M., do Alex Atala, o Amado-Bahia, do Edinho Engel, o Mocotó, do Rodrigo Oliveira e o Mani Manioca, de Helena Rizzo, fazem essa pesquisa o tempo todo, assim como o Jefferson Rueda, na Casa do Porco a Manu Buffara, em Curitiba – entre outros.

OT – Quanto tempo levará uma solução na legislação dos ingredientes artesanais?

Roberto – Estou empenhado nisso, com outras pessoas, mas sou sincero: não faço ideia, por enquanto. Passa por uma audiência pública, discussão de novas regras e alcance dessas regras, projeto de Lei, pesquisa, tramitação no Congresso. No mínimo, dois anos.

OT – O que você recomendaria para quem procura conhecer mais a fundo a Gastronomia Brasileira?

Roberto – O meu livro é uma reportagem sobre os últimos 40 anos da Gastronomia Brasileira. O livro do Carlos Dória, por exemplo, “Construção da Culinária Brasileira”, é mais profundo. Os do Alex Atala, “Por uma Culinária Brasileira” e “D.O.M. Redescobrindo Ingredientes Brasileiros” são bem interessantes.

OT – O que você recomendaria para um futuro produtor artesanal em São Paulo?

Roberto – Esses produtores, por enquanto, precisam ser apadrinhados, no bom sentido, pelos chefs ou por mercearias gourmet. Às vezes, é difícil chegar a esses pontos de contato com o consumidor, mas há espaço para isso.

OT – Gostaria de completar com mais alguma informação?

Roberto – Assim como outros autores, acho que nós precisamos nos aprofundar um pouco mais nos saberes e ingredientes da culinária indígena, por exemplo. E, claro, na cozinha regional brasileira, sempre…interpretando esses modos e sabores, como diz a Mara Salles, do Tordesilhas, conforme o paladar e o olhar do sujeito contemporâneo.

 

Sobre o livro:

Gastronomia Brasileira – Na Linha do Tempo
Edições Tapioca
Autor: Roberto Pinto
ISBN: 978-85-67362-19-9
Editor: Renato Cintra Guazelli
Capa: Nik Neves
Produção Editorial: Crayon Editorial
Preço sugerido: R$ 52,50.
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